quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Mostra 2010 - Dia 27/10

Mais um dia de boas suspresas. Hoje assisti a “Hermano”, mais um ótimo filme venezuelano que vejo na Mostra e “Air Doll”, um dos filmes mais tocantes que assisti nos últimos tempos. Tinha planejado assistir a “Asas do Desejo”, do Win Wenders, mas na última hora fiquei com preguiça. É realmente uma oportunidade rara poder assistir a esse filme em tela grande, assim como “Pink Floyd – The Wall” e “O Expresso da Meia-Noite”, que também estão na programação deste ano. Gostei muito de “Asas”, mas tem mais de duas horas de duração, é um pouco moroso demais, e preferi ver um filme novo. Por isso o substituí por “O Ciúme Mora Ao Lado”. Hoje foi o primeiro dia que deixei de ver um filme porque não consegui ingresso. Foi “Vips”, com Wagner Moura. Talvez pelo sucesso atual de “Tropa de Elite 2”, as pessoas correram pra assisti-lo, provavelmente sem nem saber do que se trata. A cota de ingressos antecipados já tinha terminado quando tentei retirar na Central, e também esgotaram cedo na bilheteria. Fui às 13h no Frei Caneca e os ingressos da sessão noturna já estavam esgotados. Paciência. O filme tem estréia prevista pra março.

Hermano ****

Essa história tem temática muito parecida com a do brasileiro Bróder (até no nome), só que nesta aqui os personagens são irmãos de fato (ou pelo menos de coração, porque um deles é adotado). Mostra a vida difícil dos irmãos na favela, o sonho de deixar as dificuldades pra trás e o esforço em não se perder no tráfico e na violência locais. Os dois jogam futebol e o sonho de melhorar de vida e deixar a favela parece prestes a se realizar quando um olheiro de um grande clube de Caracas chama os irmãos para um teste. É o segundo ótimo filme venezuelano que vejo na Mostra. Este é inclusive o candidato do país à vaga do Oscar 2011. Neste filme, assim como em Bróder, a relação dos personagens vai ser posta em prova a partir de uma situação que obriga um dos personagens a fazer uma escolha, uma renúncia, para provar que realmente é “irmão”, no conceito mais amplo da palavra.

Esse filme me fez refletir sobre essa oposição entre final original x final clichê. Quando o filme foi chegando perto do fim imaginei que o menino ia virar craque de futebol, ou melhor, que os dois irmãos conseguiriam entrar no clube, e pensei como seria chato e clichê se isso viesse a ocorrer. Mas aí então veio o final, e não foi nada disso que eu tinha imaginado, foi bem diferente do esperado e se for pensar friamente foi uma solução muito inteligente. Mas daí cheguei a uma conclusão: no fundo eu prefiro os finais convencionais, hollywoodianos mesmo. É tão frustrante ver um final triste. Não que esse seja totalmente triste, mas a gente torce o filme inteiro pelo personagem mais equilibrado e no final o sem noção termina bem e o merecedor se ferra. Porém, como já disse, o conceito de ser “irmão” é justamente o de abdicar da sua felicidade pra que o outro seja feliz. Louvável, heróico, mas triste.


O Ciúme Mora ao Lado *

Comédia com alguns bons momentos sobre um casal que se separa e decide continuar morando junto até venderem a casa. Os dois fazem de tudo para provocar ciúmes um no outro, levando affairs para casa, o que faz com que sentimentos aflorem e as brigas se acirrem cada vez mais. Esperava mais desse filme finlandês. Apesar de divertido, se estende demais na premissa do jogo de ciúmes e ainda conta com uma trama paralela que envolve um esquema de prostituição que não dá qualquer liga com a história principal. A maior vantagem de ter assistido a esse filme foi pegar lugar bom pra sessão seguinte (“Air Doll”) que foi também na sala 1 do Reserva Cultural e ficou lotada a ponto de várias pessoas sentarem no chão.

Air Doll ****

Essa pra mim foi a melhor surpresa da Mostra esse ano. Fez-me lembrar um pouco “Casa Vazia”, do sul-coreano Kim Ki-Duk, tanto pela beleza das cenas, como pela emoção que me causou. Não consigo evitar fazer comparações entre filmes. Quase todo filme que vejo me lembra outro que assisti no passado. Mas vejo tantos filmes que eles passam quase que organicamente na minha cabeça quando estou no cinema. “Air Doll” me lembrou também o americano “A Garota Ideal”, que tem enredo muito parecido, em que um homem compra uma boneca inflável e a trata como sua namorada. Mas naquele filme a boneca não ganhava vida, ela simplesmente ficava estática ao seu lado, e as pessoas à sua volta alimentavam a ilusão do protagonista. O filme era focado no dono da boneca.

Em “Air Doll” a própria boneca é a protagonista, personificando uma espécie de “Emília” ou “Pinóquio” dos tempos modernos. Alternando entre a comédia e o drama, o japonês Hirokazu Koreeda propõe uma tocante reflexão sobre o amor e a solidão. Du-na Bae, curiosamente uma atriz sul-coreana, interpreta a personagem de boneca inflável de maneira quase brilhante. Desde os primeiros momentos em que o corpo vai tomando forma humana, os gestos desajeitados nos primeiros passos e toda a inocência com que descobre a cidade de Tóquio são emocionantes.


Aos poucos a boneca vai estabelecendo relação com as outras pessoas, tornando-se cada vez mais humana. São diversas as metáforas proposta no filme, o que nos incita a assisti-lo várias vezes até extrair todas as nuances, todos os significados por trás de cada frame.


Em uma das primeiras cenas, ela senta ao lado de um senhor e lhe pergunta: “Você também é vazio por dentro? Há outras pessoas como eu?”. E ele responde que há muitos por aí como ela, inclusive ele mesmo. Assim como ela serve para o dono como uma substituta para um amor que ele perdeu, ele, o senhor, conta que é professor substituto em uma universidade, sendo requisitado somente quando o titular não vai.


Com cenas como esta, o filme provoca reflexões sobre o vazio da existência humana contemporânea, sobre a adaptação de uma criança ao mundo adulto, sobre vida e morte, sobre o poder repressor do homem e a banalização do sexo feminino como objeto sexual, e até mesmo sobre a necessidade do ser humano em explicar sua própria existência. Quando ela vai até a fábrica de bonecas, conversa com o seu criador, que lhe diz “O livre arbítrio não é mais do que uma ilusão. Todas acabam voltando”.


Apesar do final exageradamente tráfico, o filme emociona do começo ao fim.


Outro Mundo, O *

Ao assistir ao trailer imaginei um filme no estilo de Matrix. Fiquei curioso para assisti-lo também porque é protagonizado pelo ótimo Gregoire Leprince-Ringuet (de "Canções de Amor" e "A Bela Junie"). É um drama francês meio estiloso, com visual moderno, que mostra um videogame em que os jogadores são estimulados a se suicidarem na vida real. Dessa premissa poderia ter surgido um ótimo filme, mas o que vi foi um suspense obscuro bem cansativo que dá vontade de dormir.



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